terça-feira, dezembro 17

Aprender a errar melhor


«Prefiro errar sendo fiel a quem sou, do que acertar não sendo eu», em A Persistência da memória de Daniel Oliveira


Perdi-me. Perdi-me em ti porque me tinha encontrado. Sabes, as pessoas perdem-se muitas vezes umas nas outras na esperança de se encontrarem. E encontram-se muitas vezes no intuito de se perderem em alguém. Ou por alguém. Foi o meu caso, penso eu. Não sei bem. Não sei bem porque nunca me considerei uma "sem norte à terra"; os meus pés sempre pesaram chumbo. Vivo o que vejo, não o que imagino. Daí não me fiar em palavras rasas que enchem de ilusões corações que preferem verdades absolutas - que no amor, na paixão, ou no que lhe quiserem chamar, é coisa que vai deixando de existir, se é que alguma vez existiram, eis a questão. 
A minha vida nunca me deixou perder muito tempo com coisas desinteressantes, coisas essas onde incluo não só coisas, mas pessoas a que prefiro não dar esse nome. Porque para mim pessoas, são pessoas interessantes. E tu eras (és) pessoa de corpo e alma. Eu disse-to. Eu repeti-o. Eu mostrei-to. Dei-me a esse luxo, a que agora prefiro chamar erro. Errei sempre com as pessoas que considero interessantes o suficiente para me fazerem perder o norte. Errei sempre em ser fiel a quem sou. Aliás, em mostrar demasiado isso. 

Tens toda a razão.
Aliás, não tens razão nenhuma. Houvessem mais pessoas como tu, era o que no fundo me querias dizer.

Existem dois tipos de inícios numa relação, que pode nunca chegar a ter inicio, se é que me faço entender. Aqueles em que as duas pessoas se desejam sofregamente, a que chamamos paixão. E aqueles em que uma começa por ter uma empatia e nunca se sabe o que esperar da outra, a que podemos chamar muita coisa. Nomeadamente: inicio de um desamor, inicio de um quase-amor, inicio de um jogo de ping-pong - "tu és minha e eu não sou teu, mas podemos ir sendo um do outro se deixares" - ou, simplesmente, uma coisa sem nome, a que vão chamando "sexo sem compromisso" -eu prefiro chamar-lhe "tirar a barriga de misérias" (ou enche-la delas, na maior parte dos casos). Adiante.

Não tenho tempo nem paciência para estas tretas! Para mim é tudo mais simples: as pessoas ou gostam umas das outras, ou não gostam. Se gostam devem mostrá-lo - é aqui que temos o caldo entornado, acreditem!-, se não gostam têm bom remédio, não se dêem a esse trabalho. A ilusão é uma coisa feia. Tão feia quanto a mentira ou a traição. Dói quase na mesma medida quando morre em realidades.

O amor dos nossos dias é estúpido. Amor não é a palavra certa. Traduzam-me em palavras as primeiras borboletas no estômago que todos sentem, é aí que quero chegar.

Porque há-de uma pessoa fazer-se difícil para aquela que mais quer deitada na sua cama a fazer-lhe cafunés ao sábado à noite, quando sabemos que o que ela quer é deitar-se connosco também? "Para dar pica". Entusiasmante, mas estúpido. Porque é que se hão-de adiar os "eu gosto de ti" se se gosta mesmo naquele momento? "Para não assustar as pessoas". Verdade, mas estúpido. Porque é que deixamos os bilhetinhos para uma altura em que podemos dizer as coisas no ouvido, em vez de os usarmos nas alturas em que todas as palavras ditas fazem mais sentido? Primeiro porque as pessoas hoje em dia não estão habituadas a receber bilhetinhos, segundo porque podem correr o risco de um "Bom dia" soar a um "Fica comigo para sempre" e terceiro porque já pouca gente corre o risco de dizer o que sente. Vamos escrevendo por aqui e por ali, directa ou indirectamente, na esperança que as palavras cheguem a quem devem chegar, na quase certeza de que chegam mesmo - senão não o escreveríamos certamente -, aquilo que queremos que elas saibam sem nunca o dizermos. Estúpido? Verdade. Olhem para mim aqui.

Se não, quantas pessoas tem coragem de vos olhar nos olhos? Quantas pessoas marcaram um encontro só para vos dizer "Eu gosto de ti com todos os defeitos que tens chapados na cara". Quantas pessoas acordaram de manhã para vos deixar um "Bom dia!" colado na porta do carro antes de irem trabalhar? Quantas pessoas vos quiseram ver bem quando nem vocês sabiam bem como eles estavam naquele momento? Quantas pessoas tiveram a coragem de vos dizer o que mais ninguém diz? Quantas pessoas se preocuparam primeiro com o vosso bem estar, quando no fundo vocês eram o bem estar delas? Quantas pessoas vos vão abraçar e desejar sorte quando acreditam que a vossa sorte está ali, a fugir-vos dos braços naquele momento?

Poucas.
Talvez erre tanto em dizê-lo como em fazê-lo.

Aprendemos que as atitudes ficam com quem as pratica e que o amor (ou qualquer outro sentimento entre duas pessoas) não se compra assim. Aliás, o amor não se compra: o amor são as próprias atitudes. E se elas não chegam para que as pessoas se gostem na mesma medida é porque efectivamente não nasceram para se encontrar dessa forma. Ou talvez tenham nascido, mas não naquela altura ou naquelas circunstancias. 


Quem sabe? Ninguém.

Além de estúpida, sinto-me bem. Descansa. 

A vida continua...
(ouviste? A vida continua...)

Patrícia Luz
16 de Dezembro de 2013

quinta-feira, dezembro 5

O Ensino Superior Português

Sentados àquela mesa conversávamos. O tempo tinha que passar e assim escolhemos passá-lo. De professor para aluno com as cartas sobre a mesa: o ensino superior português, era o tema. Diante de umas urnas despidas de si próprias, pela falta de interesse - como tem vindo a ser habitual - dos estudantes que tanto as deviam abraçar, o olhar era de mágoa, alternado pela inconformidade e revolta em algumas palavras, confissão noutras avançadas a medo; realidades no fundo. O horizonte a que nos submetíamos e do qual estávamos bem cientes.  

Trágico. Trágico é a palavra mais acertada para definir o ensino português actualmente no nosso país. O declínio a que nos sujeitámos nos últimos anos culmina num buraco sem fundo à vista; parece ninguém se ter apercebido ainda no saco roto onde nos enfiámos. Andaremos assim tão preocupados com as nossas vidas a curto prazo que não tenhamos ainda parado para pensar naquilo que nos rodeia? Não. Enquanto estudante quero crer que não; todos vemos o que não queremos ver. 

Ora vejamos. Perfazem dez anos após a implementação do processo de Bolonha, que com todas as vantagens que, acredito, tenha trazido na uniformização da Europa como um espaço global de ensino coerente e competitivo, veio alterar drasticamente o ensino superior português num ponto, na minha opinião, fundamental: a duração dos cursos. Passaram, como a maioria de vós sabe, as licenciaturas de um modo geral a ter a duração de três anos, salvas excepções onde se entende que seja necessária uma maior especialização. E é aqui que mesmo que começa o enredo de uma história que até hoje enfrenta dias pouco felizes. 

Assim se procurou fazer frente ao tão citado provérbio português «de pressa e bem, não há quem». Uma guerrilha um pouco mal sucedida a meu ver. Trocados os cinco anos habituais, onde o conhecimento era transmitido na sua conta, peso e medida, pelos três em que a vida académica se resume a uma correria desenfreada àquele que será o próximo passo - o inicio de uma carreira profissional - estaremos nós preparados para o enfrentar? 

Creio que não. 
O ensino português de antigamente preocupava-se com um dos grandes problemas existentes no nosso país. Resumidamente, dava primazia à qualidade e não à quantidade. Cingindo-me ao curso de Gestão, de que modo podemos comparar um licenciado em cinco anos sujeito a três estágios integrados numa empresa durante o seu percurso académico e um trabalho final de curso que simplesmente sumiu do programa, com um aluno da actualidade, licenciado em três e com um estágio que interessa mais às empresas do que propriamente a quem o faz dado o conflito de interesses a que assistimos por parte destas no usufruto de mão de obra barata na satisfação, muitas das vezes, de serviços mínimos durante as férias de verão? Não digo que isto seja a regra geral, mas quantos de vocês deram por ela a "encher chouriços" naquela que devia ser a vossa rampa de lançamento na carreira para a qual depositaram o vosso esforço e dedicação?

Muitos. 

«Os cursos que não são cursos, existem.» Quando existiam cursos a sério, dizia aquele professor triste com o declinar da paixão a que dedicou toda a vida, o ensino superior era visto como a voz mais alta do povo. Assistimos a um divórcio entre o conhecimento e a sua prática. Destruiu-se o ensino tecnológico, destruiu-se o ensino politécnico e caminhamos cegamente na destruição do ensino universitário. 

Somos licenciados aos pontapés sem credibilidade. Licenciados empilhados numa das estatísticas mais infelizes do nosso país a que chamamos desemprego. Empilhados não, pendurados. 
Não acreditam que o próprio estado dúvida das "ovelhinhas" que educa? Prova disso é a avaliação dos professores. Porque haveriam de prestar um exame aqueles que exercem a profissão há menos de cinco anos? Não deveriam ser esses os mais cultivados a ensinar os mais velhos, a ser a bateria rejuvenescedora das escolas, a ter a frescura de quem tem toda a garra de transmitir os conhecimentos adquiridos, quem sabe, no ano anterior? Pois é. Já ninguém acredita em nós. Como poderemos nós acreditar num futuro risonho, neste país?

A ilusão que dá resposta a esta questão, chama-se empreendedorismo. 
A ilusão que o nosso país vive está em empreender num ensino debilitado que caminha em sentido retrogrado. 


Abramos os olhos.
Porque apesar de tudo isto, o futuro é nosso e é a nós que diz respeito. 
Não cruzemos os braços. 
Se não lutarmos pelos nossos direitos e deveres cairemos para sempre na comodidade de sermos uns falhados conformistas.

Ainda é tempo.

Patrícia Luz
5 de Dezembro de 2013

Esta é e será apenas a minha opinião.





terça-feira, dezembro 3

À minha querida Joana,



«O passado é um lugar estranho. Lá as pessoas são diferentes» não achas? Olhar para elas e não as ter agora connosco faz-nos pensar em muita coisa. Em como a vida muda, em como as pessoas nos fogem; em como nós as deixamos simplesmente ir. Quantas vezes adormecemos a pensar no vazio das nossas camas na esperança de o poder ter para sempre ocupado com aquele que achávamos ser o homem das nossas vidas? E quantas terão eles pensado na sorte que tinham em ter alguém que pensasse assim? Talvez nenhuma. Porque na verdade os homens da nossa vida dar-nos-ao valor. Valor, minha querida Joana. O que nos faltou sempre, foi o valor merecido. Nem eu nem tu o soubemos, porque o amor é mesmo assim, uma guerra desenfreada onde nós lutamos pelo fim sem nunca querermos muito bem saber do que vai e volta pelo meio. E quantas vezes fomos e voltámos sem nunca receber grande coisa em troca? O amor devia ser isso, a troca de um sentimento bom. Já o escrevi muitas vezes, tu sabes. 

Hoje sento-me aqui deste lado, como tu aí - onde habitualmente escreves também - e não sinto nada. Podes não acreditar, mas felizmente, eu não sinto nada. As últimas e únicas lágrimas que caíram no meu rosto, secaram ao teu lado neste dia de praia. Enterrei-as na areia e nunca mais lá voltei. Curei-me. E não é que o amor seja uma doença; no fundo eu é que estava a ficar doente por amor. Ninguém merece! Ninguém merece passar por isso. Por isso é que aqui estou. Cheia de esperança a escrever para ti. 

Nada acontece por acaso. Lembra-te! 
Lembraste daquela manhã em que ficámos de pijama a estudar matérias que não dominávamos para fazer o bem de quem pouco nos dava valor? Sim, essa mesmo! A manhã em nos conhecemos, melhor, por assim dizer. Qual a probabilidade de nos termos conhecido se não fossem todas as circunstancias que culminaram no fim daquilo que nos alimentava até aquele fim do mundo? Nada acontece por acaso, Joana. Se aqui me sento agora a escrever-te este texto é porque isto é mesmo verdade.

E por isso quero agradecer-lhes. A esses dois idiotas que fizeram com que conhecesse uma das pessoas mais espectaculares durante este ano de dois mil e treze que agora termina, com um final bem diferente do que era habitual. 
Já olhaste bem para ti? És linda. E pessoas como tu devem olhar para a vida com os projectos numa mão e a concretização dos mesmos na outra. Quantas noites loucas perdeste nos últimos anos, quantos amigos não visitas à séculos por falta de oportunidade, quanto tempo te resta para fazeres tudo o que há de melhor na vida? Também ela é linda e está à tua espera.

Lembro-te o texto que publiquei no dia em que fomos a almancil:  E talvez os meandros da vida estejam à espreita para nos pregar partidas e sustos por entre curvas apertadas e despistes a fundo sem que estivéssemos  à espera. Ou talvez nao seja nada disso. Provavelmente esperam-nos rectas para acelerar a fundo e fugir dos medos que nos assombravam a estrada. E se nao for nada disso é como uma pista de karts onde nos divertimos a brincar com tudo isso como se nao houvesse amanha. A vida é isso. Uma coisa que pouca gente sabe bem como conduzir e toda agente conduz sem saber.

No fundo foi o que aprendi nos últimos tempos: «Se a vida te der limões, faz limonadas»! Mas faz mesmo! 
Depois chama-me. Cá estarei para as beber contigo, sempre.

Um beijo cheio de energia, desta amiga que não te esquece,
Parabéns! 

Patrícia Luz
3 de Dezembro de 2013














A casinha cor de rosa

Mais uma vez o sol se pôs e a noite caiu sobre a cidade. Instantes. Menos um dia de vida para alguns. Mais um, para outros. Como o tempo passa... 
Regresso agora a casa como a maioria das pessoas que finalmente olham o relógio e embarcam na hora de ponta do final de tarde - desesperadas pelo sofá de suas casas, pelo abraço dos seus filhos, o carinho dos seus maridos ou apenas do silêncio das quatro paredes que as esperam - num pára-arranca despreocupado, pensativa como sempre sobre os afazeres que a vida me vai dando, ouvindo os repetidos heats da rádio que, como todos sabemos, pouco diferem de dia para dia, excepto a piadinha que por sorte se inventou à pala no noticiário do dia anterior para solucionar males maiores; apreciando o ar friorento daqueles que se movem pelo passeio, uns em tom pachorrento, outros apressados de sacos de compras e crianças pela mão e todo aquele dinamismo de carros e luzes de um lado para o outro, que fazem a cidade ganhar seu próprio nome. 
Como eu, muitos percorrem os mesmo caminhos todos os dias e este é habitual para mim. Apesar de despreocupada, vinha ansiosa. Tinha uma mensagem por ler no telemóvel e ele tocara ali ao lado, constantemente, alertando-me. Mas nem isso me fez deixar de olhar para ti com o encanto de sempre. De sempre...
O semáforo mudara. O transito estava denso e deixou-me à tua porta. Que nostalgia! Como poderia eu apreciar a luz do sol minutos antes como se fosse a melhor coisa da minha vida e estar agora especada, no meio do transito, a olhar para a minha casinha cor de rosa, toda iluminada e sentir que o melhor de mim tinha permanecido ali? O verde caíra. Não dei pela distancia a que o carro da frente já se adiantava sequer. Mas dei por mim a entrar finalmente em Dezembro, da pior das maneiras. Da pior das maneiras, a olhar para a casinha cor de rosa com olhos de ver e coração a palpitar-me nos dedos.
Quantas pessoas ali passarão sem se dar conta da triste realidade que se vive além daqueles muros altos, cor de rosa, que transpiram uma paz que poucas crianças vivem? Ali, e em todos os outros muros, de todas as outras cidades, de todas as outras casas de várias cores, onde passarei também eu sei saber, tu, ele, eles, nós. 
O meu caminho de regresso a casa ganhou outro brilho. Não por a cidade estar muito mais bonita desde ontem, com cores novas e um cheiro a natal para aqueles que o viverão perto dos seus entes queridos, no quentinho da lareira, abrindo presentes e trocando amor e gargalhadas, mas sim por me lembrar de ter a Mariana sentada no meu colo à quatro anos atrás e a ver, a ela e a todas aquelas crianças que até hoje não esqueço, suspirarem de alegria, ao verem aquelas três mil luzes acenderem-se nos seus olhos translúcidos, de quem não sabe bem o que os espera. 

Este é um mês diferente. Mas não é por isso que ora o escrevo. Só quem lá perdeu um bocadinho dos seus dias entenderá. 

Lembrem-se que em cada Natal supérfluo há pelo menos uma criança sem um presente para abrir, um abraço para receber ou um beijo de boa noite para adormecer. Lembrem-se, como eu, que ao passarem por ali, aquela (e as outras todas do país e do mundo) não é mais uma casinha cor de rosa. É uma realidade que poucos querem ver. 

Pratiquem o bem; se todos o fizermos alguém ficará melhor.

À Mariana, a irmã que eu sempre quis trazer para casa, e a todas as outras crianças que ali moram, os meus votos de sorte e esperança de um mês de Dezembro feliz. A todos os que dão a vida por elas, igualmente.
Comprometo-me a deixar-vos como sempre a minha prenda.

E se o futuro não vos sorrir como desejo, lembrem-se que um dia alguém chorou por não poder fazer mais por isso. 


Patrícia Luz
3 de Dezembro de 2013